Este livro tem um duplo objetivo: um estudo psicanalítico da clínica da toxicomania e um estudo histórico-conceitual da noção freudiana de pulsão. A teoria das pulsões é aqui reapresentada em toda sua complexidade e, ao mesmo tempo, tomada como instrumento para pensar a clínica do uso de drogas e da toxicomania. Os dois princípios do funcionamento mental de Freud e a questão do prazer são o seu ponto de partida do trabalho. Tomando, em seguida, a primeira teoria pulsional como quadro de referência, vemos que, no caso da toxicomania, é a pulsão mesma que sofre uma perversão – seja devido à fixação exacerbada ao objeto, seja por uma espécie de metamorfose na qual o registro do prazer é transposto para aquele da necessidade. Com a teoria do narcisismo, são discutidas a hipótese do narcisismo primário e a posição necessariamente instável do sujeito em relação ao objeto na experiência do toxicômano. Por fim, no que se refere à segunda teoria pulsional, dois aspectos são colocados em relevo: a compulsão repetitiva como busca de ligação e de “cura” e a destrutividade flagrante nas formas mais graves de toxicomania. Nestas, evidencia-se a ação silenciosa de Thanatos, onde o que é atacado, mais do que o objeto, é o próprio aparelho psíquico e as suas funções; o nirvana – e o misticismo do toxicômano – expressam, aqui, o extremo do gozo, ou seja, a proximidade inevitável entre êxtase e morte. Bem, se a teoria das pulsões nos ajuda, por um lado, a compreender a toxicomania, vemos como, por outro, tal problemática clínica faz trabalhar a noção freudiana de pulsão e a psicanálise de maneira mais ampla: interroga a sua teoria sobre o psíquico em diversos aspectos, põe à prova a questão da técnica – e o problema da analisibilidade se torna particularmente sensível aqui – e impõe a ela o desafio de confrontar-se com outros saberes e outras práticas da área da saúde.

Obs.: livro originado a partir de Dissertação de Mestrado (livro não inclui capítulo “Lugar da metapsicologia e a questão do método em psicanálise” – ver Separata).